5) Sacramento
É um mistério, uma verdade
revelada. Para a igreja é um rito instituído por Cristo, que serve como um
sinal externo e visível, através dos símbolos e de uma graça interna e
espiritual pela Palavra.
A visão Reformada da Ceia do
Senhor é que Cristo está realmente presente; espiritualmente e não
fisicamente. Ele está, em outras palavras, presente “pela fé” do povo de Deus e tem
comunhão com eles, alimentando-os consigo mesmo através da fé. Ele usa o pão e
o vinho para dirigir a fé deles em direção a Ele.
Essa visão Reformada é
claramente ensinada em 1 Coríntios 11.29, que fala de “discernir o corpo do
Senhor” na Ceia do Senhor, e está implicada também nas próprias palavras de
Jesus na instituição da Ceia do Senhor: “Este é o meu corpo”. Somente porque
Cristo está presente na Ceia, uma pessoa pode comer ou beber julgamento para si
quando comendo ou bebendo sem o devido auto exame. Somente porque Cristo está presente
pode haver alguma bênção na Ceia. A visão Reformada, que é também bíblica, dá um significado muito maior e à Ceia do Senhor. Então, no sacramento
encontramos e desfrutamos de Cristo em sua plenitude, como nosso Salvador e
Redentor. Que assim o façamos!
A Ceia do Senhor e a Confissão de Fé de Westminster
Como a Confissão de Fé
(Reformada) de Westminster (1643-46) define a ceia?
Os sacramentos são santos
sinais e selos do pacto da graça, imediatamente instituídos por Deus para
representar Cristo e os seus benefícios, e confirmar o nosso interesse nEle,
bem como para fazer uma diferença visível entre os que pertencem à Igreja e o
resto do mundo, e solenemente obrigá-los ao serviço de Deus em Cristo, segundo
a sua palavra.
Romanos 6.11; Gênesis 17.7–10; Mateus 28.19; 1 Coríntios 11.23; 10.16 e 11.25–26; Êxodo 12.48; 1
Coríntios 10.21; Romanos 6.3–4; 1 Coríntios 10.2–16.
Em todo o sacramento há uma
relação espiritual ou união sacramental entre o sinal e a coisa significada; por isso os nomes e efeitos de um são atribuídos ao outro (Gn 17.10; Mt 26.27–28; Tt 3.5).
A graça denotada nos
sacramentos ou por meio deles, quando devidamente usados, não são conferidos por
qualquer poder neles existentes; nem a eficácia deles depende da piedade ou
intenção de quem os administra, mas da obra do Espírito e da Palavra da
instituição, a qual, juntamente com o preceito que autoriza o uso deles, contêm
uma promessa de benefício aos que dignamente o recebem (Rm 2.28–29; 1 Pe 3.21; Mt 3.11; 1 Co 12.13; Lc 22.19–20; 1 Co 11.26).
Há só dois sacramentos ordenados
por Cristo nos Evangelhos: o batismo e a ceia. Nenhum destes
sacramentos deve ser administrado senão pelos ministros da palavra legalmente
ordenados (Mt 28.19; 1 Co 11.20,23–34; Hb 5.4).
Os sacramentos do Velho Testamento,
quanto às coisas espirituais por eles significados e representados, eram em
substância os mesmos que do Novo Testamento (1 Co 10.1–4).
A Ceia do Senhor na Igreja primitiva
O livro de Atos e as cartas
escritas às igrejas nos ajudam a aprender um pouco mais sobre a Ceia do
Senhor. Os discípulos se reuniam no primeiro dia da semana para participarem da
Ceia (At 20.7). Esta Ceia era entendida como um ato de comunhão com o Senhor
(1 Co 10.14–22). Era tomada quando toda a congregação se reunia, como
um ato de fraternidade entre os irmãos (1 Co 11.17–20), um ato
simbólico (Ceia) e o derramamento de amor entre os santos; nesse momento, acontecia que toda a igreja lembrava das Palavras de Seu Senhor e nascia a
gloriosa esperança da GRANDE CEIA VINDOURA, as bodas do Cordeiro por toda a
eternidade.
Cada cristão era obrigado a
examinar-se (v.28), para ter certeza de que estava participando da Ceia do
Senhor de um modo digno, e o modo digno é a fé, esperança e o amor sendo o
alicerce da vida cristã (1 Co 13.13). O cuidado dos pobres necessitados,
alimentando-os (2 Co 8.12–15), o amor fraterno e não fingido (Rm 12.10), a proclamação (e estudo diligente) do santo Evangelho (2 Tm 4.13;
Jo 5.39; 1 Ts 5.20) e a vida de oração (1 Ts 5.17;
Rm 12.12; At 2.42; Ef 6.18; Cl 4.2; 1 Pe 4.7; Lc 18.1).
Em suma, o modo digno é:
“Amarás o Senhor, teu Deus, de todo o teu coração, de toda a tua alma, de todas
as tuas forças e com toda a tua capacidade intelectual’ e Amarás o teu próximo
como a ti mesmo”.
(1) Fé. Palavra grega πίστιν (pistin/pistis). Denota uma convicção ou crença que diz respeito ao
relacionamento do homem com Deus e com as coisas divinas, geralmente com a
ideia inclusa de confiança e fervor santo nascido da fé; e unido a ela, relativo a Deus, a convicção de que Deus existe e é o criador e governador de
todas as coisas, o provedor e doador da salvação eterna em Cristo. Ela expressa
fidelidade, lealdade e o caráter de alguém em quem se pode confiar.
(2) Esperança. Palavra grega
“ἐλπίδος (elpidos/elpis). Denota expectativa do bem, esperança no sentido cristão, regozijo e expectativa confiante da eterna salvação. Sob a esperança, em
esperança, tendo esperança, acreditando no autor da esperança, que é o
fundamento, Cristo Jesus, o nosso Senhor.
O pão sem fermento
Ainda que o ensinamento da
Bíblia sobre a Ceia do Senhor não seja complicado, muitas diferenças de
entendimento apareceram depois do tempo do Novo Testamento. O único modo de
sabermos se estamos seguindo o Senhor Jesus é estudarmos as instruções e
imitarmos os exemplos que encontramos no Novo Testamento. Nunca estamos livres
para irmos além do que o Senhor revelou na Escritura (Cl 3.17; 1
Co 4.6 e 2 Jo 9).
Consideremos o que a Bíblia
diz em resposta a algumas questões sobre a Ceia do Senhor. Porque pão sem
fermento? Jesus instituiu a Ceia do Senhor durante os dias judaicos dos pães
asmos, uma festa anual na qual somente pão sem fermento era permitido entre os
judeus (Lc 22.15; Êx 12.18–21). Podemos apreciar mais claramente o
significado do pão sem fermento quando consideramos o significado simbólico do
fermento na Bíblia.
Não era permitido fermento nos
sacrifícios oferecidos a Deus no Antigo Testamento (Lv 2.11). A ideia de
impureza ou pecado é claramente associada com fermento em vários textos. Por
exemplo, Jesus usou fermento para falar simbolicamente de falsas doutrinas
(Mt 16.11-12). Paulo usou fermento para representar falsa doutrina e a corrupção moral (Gl 5.7–9,13,16; 1 Co 5.6–9). É plenamente
adequado, então, que o sacrifico perfeito e sem pecado do próprio Filho de Deus
seja representado por pão sem fermento: Lançai fora o velho fermento, para que
sejais nova massa, como sois, de fato, sem fermento (2 Co 5.17). Cristo, nosso Cordeiro pascal, foi imolado, e por essa razão celebramos a Ceia do
Senhor não mais com o “velho fermento”, o “fermento da maldade e da malícia”,
mas sim, com os “asmos da sinceridade e da verdade” (1 Co 5.7-8). Devemos
entender o sentido da espiritualidade, e não um mero ritual sem significado,
algo totalmente fisiológico.
Participantes da Ceia do Senhor
A Ceia do Senhor é um ato
espiritual partilhado pelo Senhor com aqueles que estão em comunhão com Ele.
Jesus não ofereceu o pão e o cálice a todos, mas aos Seus discípulos (Mt 26.26). Aqueles que estão servindo ao Diabo não têm o direito de partilhar
desta refeição com o Senhor (1 Co 10.16–22). Somos aptos a participar
com Deus em comunhão espiritual somente se andarmos na luz (em Sua Palavra). Esta é a mensagem que dEle ouvimos e transmitimos a vocês: Deus é luz; nEle
não há treva alguma. Se afirmarmos que temos comunhão com Ele, mas andamos nas
trevas, mentimos e não praticamos a verdade. Se, porém, andamos na luz, como
Ele está na luz, temos comunhão uns com os outros, e o sangue de Jesus, Seu
Filho, nos purifica de todo pecado (1 Jo 1.5–7).
O que significa participar indignamente?
Cada um que participa da Ceia
do Senhor deverá examinar-se para estar convicto de que está participando de
maneira correta, discernindo o verdadeiro significado do memorial em nome do
Senhor. Por isso, aquele que comer o pão ou beber o cálice do Senhor, indignamente,
será réu do corpo e do sangue do Senhor. Examine-se, pois, o homem a si mesmo,
e assim, coma do pão e beba do cálice; pois quem come e bebe sem discernir o
corpo, come e bebe juízo para si (1 Co 11.27–29).
A palavra grega “ἀναξίως (anaxiōs), para descrever “indignamente”, significa “de um modo indigno”. Ela
não descreve a dignidade de uma pessoa (ninguém é verdadeiramente digno de
comunhão com Cristo). Esta palavra descreve o modo de participar. A pessoa que
não leva a sério esta comemoração está brincando com o sacrifício de Cristo, e
está se condenando por não discernir o corpo de Cristo. Por essa razão, devemos
ser muito cuidadosos cada vez que participarmos da Ceia do Senhor. É imperativo
que esqueçamos as preocupações mundanas e prestemos atenção exclusivamente à
morte de Cristo. Se tratarmos a Ceia do Senhor como um mero ritual, ou se a
tomarmos levianamente e deixarmos de meditar em seu significado, nos condenamos
diante de Deus. Porque o que come e bebe
indignamente, come e bebe para sua própria condenação, não discernindo o corpo
do Senhor (1 Co 11.29).
A Ceia em alguns aspectos
Quando celebramos a Ceia, o
nosso primeiro foco é o passado. A igreja à volta da mesa celebra em memória do
Senhor (1 Co 11.23–25). Celebramos a Ceia em memória do Senhor. Somos um
povo com história, mas acima de tudo, um povo com lembrança. Não esquecemos o
nosso passado e muito menos o agir de Deus. Este olhar retrospectivo fala-nos
do quê? Ele declara o agir de Deus na história e o
cumprimento de Sua Palavra.
Celebrar a Ceia do Senhor é
afirmar que Deus não nos abandonou. É afirmar que Ele e a sua aliança
permanecem inalteráveis em relação ao ser humano; é declarar que Deus continua a
comunicar-se conosco através de Sua Palavra.
Quando celebramos a Ceia,
olhamos para o Calvário. Vemos a morte do Senhor Jesus. “O partir do pão e o beber do vinho são uma representação do corpo partido de nosso Senhor,
Seu sangue derramado”. Celebrar a Ceia é olhar para trás e ver a vergonha da
cruz. Ao celebrarmos a Ceia, olhamos para o passado e vemos que a morte foi
vencida. É ver a ressurreição. O texto citado fala que anunciamos a morte até
que Ele venha. Ou seja, o texto diz que o Senhor ressuscitou. Olhando para
trás, vemos este acontecimento histórico, mas também contemplamos a vida.
Celebrar a Ceia é olhar para o
passado e ver toda a graça de Deus. É poder contemplar o amor imensurável de um
Deus que age na história e cumpre as Suas promessas. Celebrar a Ceia não é
apenas visualizar e recordar o passado; é também fazer uma viagem interior. É
olhar para si mesmo. O apóstolo Paulo declara: Examine, pois, o homem a si
mesmo, e assim coma deste pão, e beba deste cálice (1 Co 11.28). Paulo
ordena que façamos uma viagem interior. Devemos lembrar que a fé é individual.
A salvação foi para todos, mas não somos salvos aos grupos e sim
individualmente. Portanto, cada um deve fazer essa viagem interior. Mas
qual o sentido da mesma? Para ver se existe real compreensão
deste memorial. Devemos nos fazer a seguinte pergunta: Será que entendo todo o
sentido deste memorial? É preciso uma auto avaliação para saber se há
entendimento da intervenção histórica de Deus, e que este momento representa a maneira
pela qual Deus, através de Jesus Cristo, nos redimiu.
Este exame serve para que se
traga à memoria a misericórdia de Deus e para a percepção (consciência) também
de que este momento é muito mais que um rito; é a expressão visual de tudo
quanto Deus fez por nós e para nós em Cristo Jesus. E se Cristo me amou, devo
amar ao meu irmão (Jo 13.34-35; 1 Jo 4.12,20-21). Por fim, devemos nos
perguntar: Será que tenho discernido o corpo? O que significa discernir o corpo
de Cristo? Wayne Grudem (Grudem, 1999) declara:
Assim, a frase “sem discernir
o corpo” significa sem entender a unidade e a interdependência das pessoas na
igreja, que é o corpo de Cristo. Significa não dar atenção aos nossos irmãos e
irmãs quando vamos participar da Ceia do Senhor, na qual devemos refletir o
caráter de Cristo.
Celebrar a Ceia é viver a
esperança. É olhar para cima na expectativa da chegada do Senhor. O apóstolo
Paulo declara: Porque todas as vezes que comerdes este pão e beberdes este
cálice anunciais a morte do Senhor, até que venha (1 Co 11.26). Aqui há
a certeza de que o Senhor vai regressar. Ele voltará para os Seus.
Estamos a dizer ao mundo que o
Senhor vai retornar. Declaramos que somos o povo da esperança e que aguardamos
a chegada do nosso Mestre. Aguardamos porque foi o próprio Senhor que garantiu a sua volta. Ele disse: E quando Eu for, e vos preparar lugar, virei outra
vez, e vos levarei para mim mesmo, para que onde Eu estiver estejais vós
também (Jo 14.3).
Esta é a promessa que Ele nos
fez. Celebrar a Ceia do Senhor é saber que o Senhor que subiu aos céus
regressará. Lucas enfatiza: E, estando com os olhos fitos no céu, enquanto Ele
subia, eis que junto dEle se puseram dois homens vestidos de branco. Os quais
lhes disseram: Homens galileus, por que estais olhando para o céu? Esse Jesus,
que dentre vós foi recebido em cima no céu, há de vir assim como para o céu o
vistes ir (At 1.10-11). O Senhor vai voltar!
A celebração da Ceia é o
momento em que voltamos os nossos olhos para o alto, conscientes que o regresso
do Senhor será glorioso e será também um dia de justiça. Aqueles que o
receberam como Senhor e Salvador desfrutarão da Sua graça. Entretanto, todos
aqueles que o rejeitaram, sofrerão a ira do Senhor, o “ódio” Santo de Deus.
CONCLUSÃO
A Ceia não é um simples rito.
É mais que um momento litúrgico. A celebração da Ceia do Senhor manifesta toda
a graça de Deus. Desta forma, quando celebramos a Ceia, precisamos olhar para o
passado e perceber seu contexto histórico. Deus entrou em nossa história. Ele
cumpriu a Sua Palavra. Deus é fiel. Quando celebramos a Ceia estamos a dizer
que o Senhor age na história e que recordamos a Sua manifestação.
Quando celebramos a Ceia
devemos fazer uma viagem interior. Precisamos olhar para nós mesmos para ver
se percebemos a intervenção histórica de Deus, mas também para ver se as nossas
vidas estão retas diante do Senhor e para sabermos se mantemos comunhão com
nossos irmãos.
Celebrar a Ceia é manter viva
a proclamação do Evangelho. É anunciar a morte do Senhor até que Ele venha. É
garantir que jamais a mensagem da graça será adulterada.
Celebrar a Ceia do Senhor é
olhar para o alto. É ter o coração expectante pela gloriosa manifestação do
Senhor ao Seu povo. Ele vai voltar. Quando formos celebrar a Ceia do Senhor,
devemos fazer o seguinte: 1) Olhar para trás, ver a manifestação histórica do
Senhor; 2) olhar para dentro de nós mesmos para saber se estamos aptos; 3) olhar para fora. Declarar ao mundo a graça de Deus; e 4) olhar para o alto.
Tendo o desejo ardente do regresso do Senhor.
Eu sou o Pão Vivo que desceu
do céu; se alguém comer deste pão, viverá eternamente; e o pão que deverei dar
pela vida do mundo é a minha carne (João 6.51).
NOTA:
Algumas
citações de Doctrine according to
Godliness (pg. 255-280). Tradução: Felipe Sabino de Araújo Neto.
Autor: Plínio Sousa
Divulgação: Reformados 21