TEXTO
BASE: Sl 111.10/112.1-10
INTRODUÇÃO
O salmo 112 é a segunda parte do Salmo 111.
“Esse salmo começa onde o anterior terminou e une ambos”.1 “O salmo
111 louva a Deus por sua obra e caráter, e o Salmo 112 o completa por
reconhecer a obra e o caráter do homem piedoso”.2 O salmo 111
termina fomentando o temor do Senhor
(vs.10), abrindo caminho para o Salmo 112, onde este tema é enfatizado com
maior primazia.
Tanto o Salmo 111 quanto o Salmo 112 são
acrósticos, isto é, são Salmos poéticos e se complementam em termos de
conteúdo. “O salmo 112 é semelhante ao Salmo 1. Como estes são salmos de
sabedoria, ambos descrevem o prazer da justiça, em contraste com os sofrimentos
dos ímpios (Sl 1.4-6/112.10)”.3
Enquanto o salmo 111 focaliza a glória de Deus
e as suas obras, o salmo 112 descreve o homem justo que aprendeu o que
significa temer a Deus, que é o
resultado da obediência aos preceitos divinos na vida prática. Contudo, o Salmo
112 pode ser dividido em seis partes:
1) Um chamado para louvar a Deus (vs.1a)
2) As bênçãos de Deus a quem o teme na vida
individual (vs.1b)
3)
As bênçãos de Deus a quem o teme na vida familiar (vs.2-3a)
4)
As bênçãos de Deus a quem o teme na vida social (vs.4a)
5)
O caráter moral de quem teme a Deus (vs.4b,
5-6)
6) O resultado de quem teme a Deus na
adversidade e a recompensa do ímpio (vs.7-8,
9c, 10)
ARGUMENTAÇÃO
1.
Um chamado para louvar a Deus (vs.1a)
A expressão aleluia,
no hebraico ללוה (halal),
significa “louvar, gloriar-se”. Na maior parte das ocorrências, a palavra
significa louvar, e está associada com o ministério dos levitas que louvavam a
Deus pela manhã e à noite (1Cr 23.30). Toda criação, no entanto, é chamada para
participar deste louvor (Sl 148), e vários instrumentos eram usados para
incrementar o louvor a Deus (Sl 150). A palavra aleluia, portanto, é um chamado para louvar o Senhor.4
Todavia, vemos, aqui, que o Senhor deve ser
louvado por todas as pessoas, mas especialmente pelo seu povo, os cristãos.
Este louvor deve ser ultra circunstancial, ou seja, independente da situação em
que estivermos vivendo, quer seja boa ou má, devemos louvar ao Senhor por tudo
que Ele tem feito por nós, por sua graça e misericórdia se renovarem a cada
manhã a pessoas que estão muito aquém do que ele requer de nós. Ademais, este
louvor a Deus deve ser sincero e motivado por uma vida piedosa.
2. As
bênçãos de Deus a quem o teme na vida individual (112.1)
2.1
Uma vida mais que feliz (vs.1b)
Temer a Deus não é ter medo de Deus; antes, é
tributar grande respeito ou reverência a Ele. É reconhecer a sua soberania,
grandeza e entender que somos dependentes do Senhor, que Ele está no controle de
tudo, e que vamos dar contas de todos os nossos atos ao justo juiz no último
dia (Rm 14.12).
O substantivo bem aventurado ברוך (eser),
“é um termo que significa “ser mais que feliz”, embora muitas vezes inclua
felicidade. Aquele que é bem aventurado é o objeto do favor e da graça especial
de Deus”.5
Esta felicidade, todavia,
não advém dos prazeres que possamos vir a desfrutar neste mundo, nem, tampouco,
é alcançada pelo dinheiro, pelo casamento, pelos amigos, entre outras coisas. A
verdadeira felicidade consiste numa felicidade espiritual que somente o
Espírito Santo pode nos proporcionar.
É uma felicidade
interna em Deus e inexplicável, pois está além das situações. Mesmo quando somos
perseguidos de alguma forma, mesmo quando padecemos de enfermidades, e mesmo
quando somos privados de tantas coisas, ainda assim somos felizes em Deus. Nada
pode tirar esta felicidade do cristão. Ela não é produzida pelo mundo, pelas
circunstâncias, mas pelo Espírito Santo que habita em nós.
2.2 Uma vida prazerosa (vs.1c)
O termo se
compraz חפץ (chafets), denota “ter
deleite em alguma coisa, estar inclinado a alguém, amar e desejar”. Aqui, uma
pessoa abençoada e feliz considera os mandamentos de Deus prazerosos,
atrativos, deleitosos, agradáveis e desejosos em guardar.6 O
salmista descreve o imenso prazer que o homem temente a Deus tem em observar e
guardar a sua palavra.
Salmo
119.143b – ... os teus mandamentos
são o meu prazer.
Provérbios
19.23 – O temor do SENHOR conduz a vida; aquele que o tem ficará satisfeito, e
mal nenhum o atingirá. (Almeida Século 21)
O vital motivo de tantos cristãos viverem tristes,
frustrados na vida, com a igreja, é pelo fato de não temerem a Deus. Tudo isso
é resultado de um estilo de vida que desagrada ao Senhor, a saber, uma vida
em pecado, uma vida de negligências [fazer aquilo que não deve ser feito] e
omissões [não fazer aquilo que deve ser feito]. Um cristão só irá desfrutar de
uma vida mais que feliz e prazerosa se temer a Deus acima de tudo.
3. As bênçãos de Deus a quem o teme na vida familiar (112.2-3)
3.1
A benção de Deus sobre a família (vs.2-3)
O texto em pauta apresenta uma promessa
referente a Israel nos tempos do salmista. O judeu piedoso que temia a Deus
tinha a sua família e suas gerações posteriores grandemente abençoadas como
recompensa da sua fidelidade a Deus.
Essas bênçãos tinham tanto um caráter material
quanto social, no que tange uma abundância de bens materiais (vs.3a), como posse
de terras, grandes rebanhos, alianças e acordos de paz, bençãos financeiras,
vitórias sobre os inimigos, entre outras coisas (Ex 20.6/Lv 26.3-13/Dt 7.9,
12-26/28.1-14).
Não obstante, no Novo testamento, vemos pouca
ênfase na recompensa material como resultado da obediência a palavra do Senhor
em contraste com o Antigo testamento, em que a recompensa pela obediência geralmente
era concedida em bens materiais. No entanto, os princípios mais amplos do salmo
ainda são válidos para nós hoje, que estamos na nova aliança.
Quando tememos a Deus e vivemos aquilo que
aprendemos de sua palavra, somos abençoados tanto materialmente, com o essencial
para vivermos comodamente (Mt 6.31-33), quanto espiritualmente. Indubitavelmente,
as riquezas do justo são espirituais, e não materiais. Entre essas riquezas
espirituais, temos os dons do Espírito, paz, segurança, promessas, livramentos,
providência e a principal riqueza: a vida eterna em Cristo Jesus.
Quando o cristão teme a Deus, a sua casa ou família
[marido, esposa, filhos, netos] terá pela sua vida moral exemplar o modelo para
acolitar suas vidas nos caminhos de Deus
e, talvez, sejam transformadas pelo Senhor, se assim for de sua vontade. E
mesmo depois de sua morte, esse cristão será lembrado pela sua família e pelas demais
pessoas por sua justiça e integridade perante Deus e os homens (vs.3b).
4.
A bênção de Deus a quem o teme na vida
social (112.4a)
4.1
Providência nas dificuldades (vs.4a)
Deus, geralmente, não nos livra de situações
adversas, mas nas situações adversas. Deus não livrou os amigos de Daniel da
fornalha, mas na fornalha (Dn 3.20-26). Deus não livrou Daniel da cova, mas na
cova (Dn 6).
Deus provê o escape para nós em meio à tribulação.
O Senhor não vai deixar o cristão que o teme sempre em dificuldades,
desempregado, com problemas financeiros, familiares, doente, etc...
Em meio às situações de trevas,
Deus fará surgir a luz, que
representa a benção do Senhor, a vitória, o sucesso, o livramento, a vicissitude
(mudança) de uma situação árdua para uma situação de alegria.
Jó 42.10 – Depois que Jó orou por seus amigos, o Senhor o
tornou novamente próspero e lhe deu em dobro tudo o que tinha antes. (NVI)
5. O
caráter moral de quem teme a Deus (112.4b, 5-6, 9a)
5.1
Benigno, misericordioso e justo (vs.4b)
Essas três virtudes são primeiramente usadas no
Salmo 111, na descrição que o autor faz dos atributos comunicáveis de Deus, e
expressa o tratamento do Senhor aos que o reverenciam, isto é, Deus sendo
piedoso, misericordioso e justo para com aquele que o teme.
Todavia, no Salmo 112, esta é uma aplicação que
declara que o homem temente possui essas mesmas qualidades de Deus. Ele é
benigno, misericordioso e justo com os outros, uma vez que se torna cada vez
mais parecido com Cristo, no que se refere a sua humanidade impecável, que
devemos prosseguir em imitar constantemente.
1
Coríntios 11.1 – Sede meus
imitadores, como também eu sou de Cristo. (Almeida Século 21)
Efésios
5.1 – Portanto, sede imitadores de Deus como filhos amados. (Almeida Século 21)
5.2 Liberal
(vs.5,9a)
O termo hebraico se compadece e empresta ונח (hanan), significa “um
sinal de bondade para com alguém inferior. Na literatura de sabedoria, este
verbo é usado principalmente nas relações humanas, para indicar atos de
benevolência para com alguém necessitado”.7
O homem que teme a Deus é “generoso no uso dos bens que o Senhor havia
lhe dado, dividindo-os com os pobres e emprestando de bom grado, sem cobrar
juros, conforme a lei determinava (Ex 23.11; Lv 25.35-38; Dt 15.7, 11; 23.19-20)”.8
Quando esse vê o seu próximo em dificuldade, logo se mostra benevolente e
liberal em ajudá-lo por amor a Deus e ao próximo.
Paulo cita o versículo 9 deste Salmo em 2 Coríntios 9.9 para elucidar como deve ser a motivação dos
cristãos ao serem generosos em ajudar o seu próximo e a contribuir
financeiramente para a obra de Deus. O homem que teme a Deus tem prazer em
ajudar naquilo que ele pode dentro de suas condições, tanto o seu próximo como
a igreja. Como resultado disso, o texto diz que este homem é feliz na sua vida.
Salmo
41.1a – Bem-aventurado é o que dá atenção ao pobre (Almeida Século 21)
Provérbios
11.24 – Há quem dê generosamente, e vê
aumentar suas riquezas; outros retêm o que deveriam dar, e caem na pobreza. (NVI)
5.3 Honesto
(vs.5b)
Esta parte final enfatiza a continuação do
resultado das bênçãos de Deus sobre a vida do homem que o teme, no qual todo o
salmo minudencia. A passagem termina com uma enfática declaração do salmista: Ele defenderá a sua causa em juízo.
A ARA
não traduziu adequadamente essa passagem. Sendo assim, as melhores traduções seriam
a da NVI e da NBV. Vejamos a passagem nessas traduções:
NVI: Feliz é o homem que empresta com
generosidade e que com honestidade conduz
os seus negócios.
NBV: Feliz aquele que empresta; e conduz os seus negócios com honestidade.
5.4 Estável
(vs.6)
A pessoa que teme a
Deus não é inconstante, conforme assinala Tiago 1.8. O caráter de quem teme a
Deus possui estas 3 marcas fundamentais que Paulo descreve em 1 Coríntios 15.58:
Firmeza, constância e abundância no
Senhor.
Quem é estável não se deixa ir de um lado para
o outro; não desanima, não retrocede, não se deixa permanecer abalado por circunstâncias
negativas da vida. Antes, busca a superação em Deus.
Quem é estável não pensa em desistir da fé e da
comunhão da igreja por causa das intempéries da vida que tentam nos enfraquecer.
Pelo contrário, quem é estável continua perseverante na fé, na igreja, fazendo
a obra do Senhor, na presença de Deus e produzindo a cada dia mais frutos que
glorificam a Deus.
CONCLUSÃO
6. O
resultado de quem teme a Deus na adversidade e a recompensa do ímpio (vs.7,
8, 9c, 10)
O homem que teme a Deus
tem a bênção divina na sua vida. Como resultado de uma vida em temor, o cristão
não precisará se preocupar com as tribulações da vida, pois ele sabe que Deus é
capaz de livrá-lo e verá o seu desejo cumprido com a derrota dos seus
adversários (vs.7-8).
O homem que teme a Deus aqui é exaltado pelas
suas boas obras que demonstram a sua fé genuína (vs.9c). Enquanto o ímpio
furioso e derrotado o vê desfrutar de honra e prosperidade, o seu próprio
desejo perece mediante a humilhação e a frustração (vs.10; 91.8).
Provérbios
16.6b – pelo temor do SENHOR os homens evitam o mal.
Eclesiastes 12.13 – Agora que
já se disse tudo, aqui está a conclusão: Teme a Deus e obedece aos seus
mandamentos; porque este é o propósito de todo o homem. (Almeida Século 21)
NOTAS:
1. Bíblia de Estudo
Macarthur. Notas de Rodapé, pág 769.
2. Allan Harman. Salmos, pág 384.
3. Bíblia de Estudo
Genebra. Notas de Rodapé, pág 776.
4.
James Strong. Dicionário do Antigo
Testamento Hebraico, pág 1606.
5. Bíblia de Estudo
Genebra. Notas de Rodapé, pág 690.
6.
Bíblia de Estudo Plentitude. Palavra
chave, pág 597.
7. James Strong. Dicionário do Antigo Testamento Hebraico,
pág 1646.
8. Warren Wiersbe. Comentário Bíblico Expositivo. Poéticos, pág 150.
Autor:
Leonardo Dâmaso
Divulgação:
Reformados 21