Certo
dia Jesus estava orando em determinado lugar. Tendo terminado, um dos seus
discípulos lhe disse: “Senhor, ensina-nos a orar, como João ensinou aos
discípulos dele (Lucas 11:1).
Muitos dos livros escritos
sobre o assunto de oração sugerem que a melhor forma de aprender sobre oração é
realmente orando. Eles dizem que a melhor forma de aprender sobre a oração (ou
sobre a maioria das outras coisas) não é falando ou lendo sobre ela, mas
praticando-a. “Aprender fazendo” é uma teoria muito popular de educação, e
estes livros estão aplicando-a à questão de como uma pessoa deveria aprender a
orar. Se essa teoria de aprendizagem é correta, então há um valor limitado em
se gastar horas após horas tentando construir uma teologia bíblica de oração;
antes, nosso tempo é mais bem gasto orando de fato. A oração é melhor aprendida
por experiência.
É impossível aprender sobre
oração por experiência, pois é impossível até mesmo começar sem quaisquer
instruções ou suposições prévias não deriváveis de experiência. O que é oração?
Eu oro a alguém ou a alguma coisa? Quem é este alguém ou alguma coisa? Quais
são os atributos deste alguém ou alguma coisa? Qual é o meu relacionamento com
este alguém ou alguma coisa? Eu tenho acesso imediato e direto a este alguém ou
alguma coisa, ou eu preciso de um mediador para contactar este alguém ou alguma
coisa? Quem ou o que é este mediador, e quais são os atributos deste mediador?
Qual é o meu relacionamento com este mediador? Importa qual postura ou posição
eu tomo durante a oração? Pelo que ou por quem eu devo orar? Com que
freqüência, por quanto tempo e intensidade eu deveria orar? Eu devo persistir
em minhas solicitações, ou deveria apresentar cada petição somente uma vez? A
experiência não pode responder nenhuma dessas questões, mas precisamos responder
todas elas e muitas outras para orar apropriadamente. De fato, mesmo fazer as
perguntas acima pressupõe algum conhecimento e reflexão sobre o assunto.
As pessoas nos dizem que
aprendemos como orar por experiência, e que podemos aprender mais sobre oração
praticando-a do que falando sobre ela ou lendo algo sobre ela. Mas, onde está a
justificação bíblica para tal reivindicação? Elas querem dar a impressão que
estão dando este aviso porque elas tomam a oração seriamente, e que elas querem
que outras pessoas a tomem seriamente também. Mas eu diria que o aviso deles é
sacrilégio — eles estão tratando a presença de Deus como um lugar de
experimentação antes do que um lugar de adoração. Se a Bíblia já nos deu muitas
instruções explícitas sobre oração, então, nós faremos melhor estudando-as ao
invés de aprendê-las durante a oração. Nós abusamos da paciência e da
misericórdia de Deus se nos aproximamos dEle, sem primeiro aprender como nos
aproximarmos dEle, especialmente quando Ele já nos deu instruções sobre o
assunto.
Embora Deus nem sempre execute
o juízo imediatamente sobre aqueles que se aproximam dEle impropriamente, há
exemplos no Antigo Testamento quando Ele matou aqueles que falharam em seguir
Suas instruções para a adoração. Pelo princípio de tentativas e erros, alguém
poderia facilmente se tornar um sacerdote morto antes dele se tornar um
sacerdote experiente. Além de insistir que é impossível aprender algo por
experiência em primeiro lugar, meu ponto é que você não deveria tentar aprender
a partir da experiência o que Deus já lhe disse por instruções verbais. No
mínimo, se você aprender sobre oração por experiência, você pode terminar
formando muitos maus hábitos e falsas idéias que podem nunca receber correção.
Portanto, concluímos que aprender por experiência quando diz respeito à oração
é uma tentativa irreverente e impossível.
Quando os discípulos pediram
para Jesus ensiná-los a como orar, Jesus não lhes disse para aprender como
oração praticando a oração, mas Ele lhes ensinou como orar dando-lhes
instruções verbais. Os discípulos também mencionaram que João o Batista ensinou
seus próprios discípulos a como orar, de forma que sabemos que aqueles
discípulos também aprenderam a orar por instruções verbais, e não por
experiência. Assim, entendemos que a oração pode ser ensinada, e que o modo de
aprender como orar não é por experiência, mas por palavras. Isto é, o modo
bíblico de aprender sobre oração é realmente falando e lendo sobre ela, e não a
praticando. Visto que o nosso tópico é oração, eu não tomarei tempo para
exemplificar, mas este princípio é verdadeiro também sobre outros aspectos da
vida espiritual.
Nós aprendendo lendo ouvindo e
pensando, e não fazendo. Aprender lendo, ouvindo e pensando torna pelo menos
possível que uma pessoa faça algo corretamente na primeira tentativa. Mas
aprender pela prática, experiência, ou por tentativas e erros, insere a
necessidade de falha no próprio princípio de educação. Eu tenho mostrado em
outros lugares que, mesmo se a sensação que alguém recebe corresponder ao
objeto que produz tal sensação, alguém deve fazer inferências a partir de tal
sensação que produza conhecimento, e inferências a partir de sensações sempre
são falaciosas.71
A título de exemplo, mesmo se
assumirmos que é possível aprender a partir de nossos enganos,72 como você
saberá quando você cometeu um engano na oração? Novamente, a título de exemplo,
mesmo se assumirmos que você possa perceber alguns destes enganos por
experiência, você pode perceber todos eles ou até mesmo a maioria deles por
experiência? Mas você não pode nem mesmo responder esta pergunta por
experiência, visto que por experiência você não pode saber quantos enganos você
está cometendo em oração — visto que, novamente, você precisa aprender, em
primeiro lugar, o que é certo e o que é errado, e por experiência, o que é
impossível — e, portanto, você não pode me dizer se você percebeu todos ou a
maioria dos seus enganos na oração, por experiência. O problema piora mais e
mais quando continuamos a pensar sobre ele.
De fato, é muito provável que
você esteja cometendo vários enganos quando ora, mas você não os reconhece como
enganos. Ao invés de ser corrigido por experiência, quanto mais experiência
você tem em oração cometendo aqueles enganos, mais eles se reforçarão como
hábitos. Por experiência, você pode ao menos saber que é errado orar ao anjo
Gabriel ou a Buda, ao invés de orar a Deus o Pai? Muitas pessoas têm orado por
anos a Buda, e após muita experiência, elas ainda não reconheceram o seu erro.
Em adição, qual é a nossa justificativa por forçar Deus a suportar os nossos
enganos na oração, quando nós podemos evitá-los simplesmente lendo a Bíblia? Se
nós a aprendêssemos a partir da Bíblia em primeiro lugar, saberíamos como não
cometer aqueles enganos de forma alguma.
Se você insiste em aprender
por experiência quando Deus já te deu a informação necessária por revelação —
isto é, pelas palavras da Bíblia — em efeito, você não está cerrando o seu
punho contra o céu e dizendo, Eu me recuso a usar a sua forma de aprender como
Te servir! Eu usarei a minha própria forma? Assim como é pecaminoso servir a
Deus de uma forma quando Ele prescreveu outra forma, é também pecaminoso tentar
aprender como Lhe servir de uma maneira quando Ele prescreveu outra. Devemos
nos submeter a Deus, não somente no que pensamos, mas também em como chegamos a
pensar assim.
A melhor forma de aprender
sobre oração ou outra coisa é falando sobre ela, lendo sobre ela e pensando
sobre ela. A maioria dos crentes aprende sobre oração através deste método
lendo e ouvindo instruções entregues por ministros cristãos, que estiveram
supostamente estudando a Escritura sobre o assunto. Contudo, embora a própria
Escritura seja infalível, os ministros humanos não o são. Mas o que á primeira
vista parece ser um problema, serve somente para acentuar as vantagens de
aprender através da leitura e da audição. Isto é, as apresentações verbais
estão sujeitas ao escrutínio preciso e público; elas podem ser a base para o
debate prolongado e a reflexão cuidadosa. Através de discussões diligentes e
rigorosas sobre o assunto — isto é, falando, lendo e pensando sobre ele, ao
invés de praticando-o — podemos chegar à princípios com respeito à oração e
podemos estar confiantes de que eles estão de acordo com a vontade revelada de
Deus.
NOTAS:
70. Para uma explicação sobre o porquê eu me oponho a
aprender através da prática, por favor, leia meu livro, Preach the Word.
71. Se você colocar uma inferência na forma de um argumento, você pode ter uma premissa maior, uma premissa menor e uma conclusão. Se a conclusão diz mais do que as premissas necessariamente implicam, então ela é uma inferência indutiva, que é sempre inválida. Mas para produzir conhecimento a partir de experiência ou sensação, você deve fazer várias inferências indutivas. Portanto, aprender por experiência é sempre logicamente falacioso e não pode chegar à verdade.
72. Eu mantenho que é logicamente impossível aprender — isto é, formar proposições que constituam conhecimento — a partir de sucessos ou fracassos, visto que as inferências de tais exemplos sempre são falaciosas.
71. Se você colocar uma inferência na forma de um argumento, você pode ter uma premissa maior, uma premissa menor e uma conclusão. Se a conclusão diz mais do que as premissas necessariamente implicam, então ela é uma inferência indutiva, que é sempre inválida. Mas para produzir conhecimento a partir de experiência ou sensação, você deve fazer várias inferências indutivas. Portanto, aprender por experiência é sempre logicamente falacioso e não pode chegar à verdade.
72. Eu mantenho que é logicamente impossível aprender — isto é, formar proposições que constituam conhecimento — a partir de sucessos ou fracassos, visto que as inferências de tais exemplos sempre são falaciosas.
Autor:
Vincent Cheung
Fonte:
Monergismo
Sobre
o autor:
Vincent Cheung é o presidente
da Reformation Ministries International [Ministério Reformado Internacional].
Ele é o autor de mais de vinte livros e centenas de palestras sobre uma vasta
gama de tópicos na teologia, filosofia, apologética e espiritualidade. Através
dos seus livros e palestras, ele está treinando cristãos para entender,
proclamar, defender e praticar a cosmovisão bíblica como um sistema de
pensamento compreensivo e coerente, revelado por Deus na Escritura. Ele e sua
esposa, Denise, residem em Boston, Massachusetts.