Os
Maiores Problemas Entre a Revelação Moderna e as Escrituras Sagradas
1. O termo “revelação” no N.T
Em nenhum lugar nas páginas do
Novo Testamento há o ensino de que Deus continuaria a trazer novas revelações
para o seu povo. As Escrituras apontam para sua perfeição em Apocalipse. Nada
mais de revelação deverá ser esperado.
Muitos alegam o fato de terem
tido insights (intuições) que podem ser apenas um aspecto da iluminação.
Outros afirmam que ouviram a voz de Deus, o que significa que ou estão
mentindo ou Deus inaugurou uma terceira aliança na qual ele Se revelará novamente
através de Sua comunicação verbal inspirada, infalível e autoritativa, pois Deus
não fala de outra maneira, já que ele não é homem. Essas pessoas têm levantado
o argumento de que não precisam de tais credenciais, pois até mesmo Balaão
profetizou sem credencial de profeta inspirado, o que pode acontecer nos dias
de hoje. O problema com este argumento é que, mesmo que Balaão não tivesse
credencial de profeta, a sua profecia ficou registrada nas Escrituras Sagradas
do Velho Testamento. Onde estão as profecias escrituradas dos profetas
modernos?
Não há indício no Velho ou
Novo Testamento de que a revelação tenha sido uma prática de cultos
para-eclesiásticos, tendo em vista indivíduos e seus mais peculiares e particulares
interesses.
A revelação sempre teve como
alvo trazer à luz a história da salvação. Ela sempre foi ou para o povo de
Israel (a Igreja do VT) ou para a Igreja. Quando a revelação era aplicada a pessoas
individualmente, era porque elas, certamente, faziam parte da história da
salvação que ficaria escriturada como Palavra de Deus; algo que não pode mais acontecer
hoje porque a história já está completa. A revelação nunca foi para consumo particular,
e sempre trazia doutrina revelacional (1 Co 14:6,26). A Bíblia nada ensina
sobre o uso da revelação para crentes comuns que frequentam a igreja todos os
dias. Deus tinha palavras revelacionais (doutrina) para a igreja (1 Co 14:6,
19) ou para os incrédulos (o evangelho) que porventura entrassem na igreja da
era apostólica (1 Co 14:26).
O Novo Testamento não ensina
nenhuma outra forma de revelação para a Igreja de Cristo. É muito comum, nos
dias modernos, pessoas chamarem de “revelação” algum insight que tiveram sobre
os assuntos mais particulares de suas vidas (problemas de saúde, negócios,
casamentos, problemas existenciais, etc.). Muitos utilizam os exemplos bíblicos
de personagem do Velho e Novo Testamentos, e querem imitá-los, dizendo que se aconteceu
com eles, pode acontecer também hoje conosco. A fraqueza deste argumento está
no fato de que todas as pessoas envolvidas no relato bíblico foram escolhidas
por Deus para fazerem parte do processo histórico-redentivo, ou seja, com
aquela revelação individual havia algo relacionado a Cristo e seu reino. Elas
sempre foram dirigidas por revelações inspiradas e infalíveis. O fato é que
hoje as pessoas querem ser guiadas por revelação nos mínimos detalhes de suas
vidas, nada tendo a ver com o processo histórico-redentivo, e, além disso, não
são guiadas por uma revelação inspirada e infalível. Os profetas modernos, com
certeza, têm cometido erros muitos sérios.
O termo grego “APOCALYPSIS”,
“revelação”, acontece nas seguintes passagens do Novo Testamento: 1 Pe 5:1; Lc
17:30; Rm 1:17,18; 1 Co 14:30; 2 Ts 3:3; Gl 3:23; 2 Ts 2:6; 1 Pe1:5; 1 Co 3:13;
Mt 10:26; Lc 12:2; 2 Ts 2:8; Lc 2:35; Mt 11:27; Lc 10:22; Gl 1:16; 1 Co 14:16;
Fp 3:15; 2 Ts 1:7; 1 Pe 1:7,13;4:13; 2 Co 12:1,7; Rm 2:5; Gl 1:12; Ef 1:17; Lc
2:32.
Essas são todas as ocorrências
para o termo e derivados. Com exceção de Ef 1:17 e Fp 3:15, onde o termo
refere-se à iluminação, em nenhuma destas passagens podemos encontrar outro
significado para “revelação” a não ser a manifestação de um mistério que estava
escondido. Sendo assim, o termo não pode ser usado para insights que acontecem dentro
da própria mente. Quando o termo é usado no sentido de iluminação, o contexto facilmente
indicará tal uso. Mas nunca encontraremos o termo sendo usado para profecia com
um sentido iluminatório. Muitos liberais têm usado o termo APOCALYPSIS para revelações
na própria mente, na alma ou no coração. A revelação do protestantismo liberal
acontece no próprio homem. Mas esse uso não é neotestamentário quando se trata de
profecia. O liberalismo defende uma revelação antropológica ou existencial, o
que não corresponde ao modelo do profetismo bíblico revelacional.
2. Implicações da comunicação verbal de Deus
Um grande erro cometido pelo
movimento de revelação é o fato de não se levar em conta a natureza da
comunicação verbal de Deus. Ouvi certo sermão em que o pregador dizia frequentemente
o Senhor me falou. Percebi que ele repetiu tantas vezes essa mesma expressão
que ficou claro não se tratar de uma comunicação verbal de Deus, mas tudo não
passava de um vício de linguagem. Muitas pessoas usam essa linguagem (o Senhor
me disse) para seus mais variados palpites da alma. Nunca levam em conta que Deus
só fala inspiradamente, autoritativamente e infalivelmente. Quando profetas
diziam coisas que Deus não falava, eles eram punidos com a morte, pois isso
corresponde a levantar um falso testemunho contra Deus. No mundo dos homens,
quando alguém afirma que outra pessoa disse algo que na realidade não disse,
pode tornar-se caso de polícia, pois corresponde a um delito grave. Quantas pessoas
estão brincando com coisa tão séria! Estão elas colocando palavras falíveis e
mentirosas na boca de Deus, e acusando-O de suas falsas revelações.
Algo que precisamos entender
ainda sobre a comunicação verbal de Deus é o fato de que Ele sempre conduziu
seu povo com uma palavra infalível, inspirada e autoritativa, tanto no Velho
quanto no Novo Testamento. O grande problema com as revelações modernas é o
fato de que elas não são inspiradas, nem infalíveis, nem autoritativas. Isso significa
que Deus incorreu num terrível retrocesso na maneira de dirigir o Seu povo,
pois antigamente dirigia Seu povo por meio de revelações inspiradas, e agora
por revelações não inspiradas. Por que deixaria Deus Seu povo sofrer tamanho
prejuízo nos dias modernos?
3. A função canônica da comunicação revelacional de Deus
É verdade que muitas coisas
que Deus revelou a Israel não foram escritas. Como também muitos milagres de
Jesus não foram registrados. Mas tudo o que foi registrado foi suficiente para
dirigir a vida do povo de Deus. Mesmo assim, esses fatos não tendo sido escriturados,
eles sempre foram a Palavra infalível e inspirada de Deus, pois saíram da boca
de seus santos profetas (1 Pe 1:20-21). Mesmo que muitas palavras proféticas
dirigidas a Israel não tenham sido escritas, elas foram usadas como Palavra de
Deus, e correspondiam ao cânon da época. Como também durante a época em que o
Novo Testamento estava sendo escrito não havia ainda um cânon das escrituras
do Novo Testamento, mas a igreja tinha um cânon oral, que eram as diretrizes da
Nova Aliança, reveladas por meio dos apóstolos e dos profetas.
É claro que hoje ninguém
cairia no absurdo de fazer uma bíblia de revelações modernas, mas se alguém
colocar em um pedaço de papel o registro das palavras que alguém disse ter
recebido do Senhor, sem dúvida esse pedaço de papel se tornaria um pedaço de
Bíblia. Qual é, pois, a diferença de natureza entre a palavra falada e a
palavra escrita de Deus? Nenhuma! Ambas são inspiradas, infalíveis e
autoritativas. Se a palavra falada for escrita, ela se tornará a Palavra
escrita; foi assim no passado, então, por que haveria de ser diferente no presente?
Ora, isso entraria em tremendo conflito com a ideia de um cânon sagrado, e
abriria precedentes para a formação de milhares de “Bíblias” ao longo do tempo
e do espaço.
Essa é uma das razões, pela
qual nunca podemos imaginar que Deus se comunique verbalmente nos dias
modernos. Não há como compreender as palavras de Deus sem o aspecto canônico.
Toda palavra revelada implica em canonicidade. Mesmo que não entre num cânon
para uma futura geração, mas ela funcionará como cânon para a geração que faz
uso dela; foi assim no passado. Mesmo que as palavras de Deus dirigidas a
Israel não tenha sido registradas para nós, naquela época elas tinham seu valor
canônico para dirigir a vida de Israel. As palavras provindas de Deus sempre
são palavras de Deus. Sua escrituração não pode alterar sua natureza.
4. O problema dos dois cânons
O que normalmente se diz
dentro do movimento de revelação moderno é que Deus já revelou a doutrina, e,
agora, ele está revelando Sua vontade para a vida dos crentes. Divide-se assim
a revelação em dois cânons: o cânon para a salvação - a Bíblia, e o cânon para a
vida - a revelação moderna. Com esta concepção, muitos acham que Deus falou
outrora sobre doutrinas e agora ele fala sobre a vida. Creem que fazendo assim
não ferem a suficiência nem a autoridade das Escrituras.
A falsidade deste argumento
está no fato de Deus nunca ter produzido dois cânons. Paulo referiu-se às sagradas letras para a salvação que eram as Escrituras do Velho Testamento, e
enfatizou-as como o cânon da vida proveitosa para ensinar, repreender, corrigir,
instruir em justiça, para que o homem de Deus seja perfeito e perfeitamente
preparado para toda boa obra (2 Tm 3:15-16).
Uma outra fraqueza da ideia
dos dois cânons é que o “cânon da vida” dos que vivem em busca de novas
revelações nunca acrescenta nada de novo. Geralmente as revelações para dirigir
a vida dessas pessoas são meras repetições da linguagem e das ideias da Bíblia.
Na maioria dos casos são “promessas” subjetivas, sem condição de se averiguar a
falsidade de tais revelações. Certa vez eu estava dando uma palestra, e uma certa
senhora me disse que Deus tinha falado com ela em alta voz. Perguntei-lhe o que Deus tinha lhe dito, e ela
citou, decorado, Josué 1:9 como sendo as palavras que Deus havia dado para
confortá-la. Ao dizer isso, aquela mulher revelou-se ser uma típica crente vagarosa
em ler as Escrituras, que não cria nas promessas de Deus, e Deus precisaria
estar sempre lembrando-lhe Suas promessas, como fazia com Israel, que em tão
pouco tempo se esquecia dos milagres e das promessas de livramento. A esse povo
Moisés tinha que estar sempre lembrando por causa da sua dura cerviz.
Um outro detalhe dos dois
cânons é que o “cânon da vida” não é inspirado nem autoritativo. Como pode
alguém confiar sua vida espiritual a um cânon sem nenhuma autoridade nem
inspiração? Isto seria pura irresponsabilidade de quem se arrisca a dirigir sua
vida por uma palavra que não seja a Palavra inspirada, inerrante e autoritativa
de Deus. Essa foi a mesma prática pagã da igreja Católica Romana quando
substituiu a Palavra infalível de Deus pela palavra “infalível” do Papa. Os que
dirigem suas vidas por uma palavra que não seja a Palavra de Deus estão no
mesmo pecado do Catolicismo, substituindo a Palavra de Deus pela palavra do
homem.
5. A questão da imperfeição da doutrina apostólica
Se a revelação ainda não
cessou, e a igreja ainda precisa de revelações hoje para sua vida, isso
implicaria em que a doutrina apostólica ainda é imperfeita. O que mais os apóstolos
escreveram foram os princípios para a vida cristã da igreja. A maioria das
cartas de Paulo é para tratar de princípios práticos para vida de cada crente.
Se acharmos que Deus ainda continua revelando princípios para um cânon da vida,
então os princípios apostólicos não foram suficientes, e deixaram uma brecha
que está sendo suprida pelas novas “revelações do Espírito hoje”. Sendo assim,
a doutrina apostólica estaria incompleta e imperfeita, dependendo de novas
revelações. A grande dificuldade é que os princípios apostólicos são divinos,
inspirados, infalíveis e autoritativos, enquanto que os princípios do suposto
cânon da vida, revelados pelos profetas modernos não são. Ora, como podem os
princípios apostólicos inspirados serem completados e aperfeiçoados por
princípios revelados não inspirados?
6. Como Deus dirige seu povo
É muito comum ouvir-se dizer
entre aqueles que defendem a revelação moderna que a razão dessas novas
revelações é o fato de Deus querer guiar sua igreja com uma palavra extra
Bíblia. O fato é que ninguém percebe que Deus só dirige o seu povo com uma
palavra infalível. Se Deus estivesse dirigindo o Seu povo por meio de uma
palavra trazida do céu hoje, certamente que essa palavra seria infalível. Foi
assim nos tempos bíblicos. A prova de que a revelação cessou é que Deus já tem uma
palavra infalível para sua Igreja, e desde que essa palavra terminou de ser
escrita, nada mais foi escrito ou revelado de maneira infalível. Deus dirige
Seu povo hoje através da Palavra infalível, que está completamente escrita.
7. O tipo de cristianismo fácil proposto pelo profetismo moderno
A busca por novas revelações é
um fator negativo na vida dos que se dizem crentes. O modelo de fé deixado por
Jesus é aquele que não depende de ver, ouvir ou sentir. Jesus repreendeu a
Tomé porque ele queria ver. Os que buscam revelação para ter fé em Deus ou
melhorar sua vida espiritual estão caindo numa forma de cristianismo fácil, que
foi condenado por Jesus. Ora, é claro que é muito mais fácil viver um
cristianismo onde se pode ouvir a voz de Deus e ver o que Deus faz do que crer
em Suas promessas. Porém, tremendamente difícil é viver um cristianismo onde temos
que crer nas promessas de Deus contra toda a adversidade da vida, sem nada ver
ou ouvir. É muito mais fácil crer quando há horizontes para isto, mas,
tremendamente difícil é crer quando eles estão ausentes. Que crentes são esses
que precisam ouvir a voz de Deus para ter fé? Isso nos lembra Israel no
deserto, quando era necessário Moisés operar algum milagre para que o povo
cresse em Deus, mesmo assim, depois de pouco tempo da evidência do milagre, eles
caíam em pecado novamente. O modelo da verdadeira fé é aquele que não depende
do que vê, ouve ou sente, mas apenas crer. Esse é o modelo da fé de Abraão e de
Paulo, e o modelo recomendado por Jesus como a verdadeira fé do crente.
8. O propósito da revelação
Qual o propósito da revelação
hoje?
Muitos diriam que é para
consolar os crentes, para advinhar ou revelar pecados da igreja, e ainda outros
dizem que é para guiar e edificar os crentes em algum propósito estabelecido
por Deus. Esse modelo não é bíblico, pois nada há no N.T que indique que a revelação
era empregada para uso particular, (1 Co 14:6). Todas as coisas necessárias
para a perfeição dos filhos de Deus já foram reveladas em Sua Palavra. O que
muitas pessoas estão fazendo hoje é tentando trazer uma palavra advinhadora
para a vida de alguém, o que não é normativo nas Escrituras. Em nenhum lugar
nas Escrituras há o ensino de que a revelação foi dada à igreja
para adivinhar aspectos particulares da vida dos crentes ou de coisas que Deus
tem para fazer com alguém. Ao contrário, o uso correto da revelação foi ensinado
por Paulo, que deixou claro a finalidade da profecia: exortar, consolar, e
edificar. Mas nunca de forma particular, e sim coletiva, corporativa, na Igreja
e para toda a igreja (1 Co 14:26).
Autor:
Moisés Bezerril
Fonte:
Monergismo