10 de maio de 2016

Arrebatamento Secreto: Fato ou Ficção?


Muitos sinceros cristãos creem que a Segunda Vinda de Cristo ocorrerá em duas fases distintas. A primeira fase é conhecida como “o arrebatamento secreto” da Igreja e pode ocorrer a qualquer momento. Nessa ocasião, Cristo desce apenas para as proximidades da Terra para ressuscitar os santos adormecidos e para transformar e glorificar os crentes vivos. Ambos os grupos são então arrebatados, ou seja, levados secreta, súbita e invisivelmente, para encontrar no ar o Senhor que desce. Esse corpo de crentes, chamado de “Igreja”, então subirá para o céu para celebrar com Cristo por sete anos as bodas do Cordeiro, enquanto os judeus e os gentios não convertidos permanecerão sobre a Terra para sofrerem os sete anos finais de tribulação.

Ao final deste período de sete anos, a segunda fase da Vinda de Cristo, geralmente o Retorno ou Revelação, terá lugar. Cristo então vem em glória com os santos até a Terra para destruir Seus inimigos na Batalha do Armagedom, e para estabelecer o Seu trono em Jerusalém e iniciar seu reino milenial terrestre.

Quanto tempo se espera que levará para o desaparecimento maciço dos verdadeiros cristãos de todas as nações? Muitos acreditam que esse evento está iminente porque sua principal pré-condição, ou seja, o restabelecimento do Estado de Israel e a posse da antiga Jerusalém já tiveram lugar. Essa crença é expressa em adesivos de automóveis como o que declara: Se o motorista desaparecer, agarre o volante, ou, Em caso de arrebatamento, este carro ficará desgovernado.

Segundo os cálculos iniciais de Hal Lindsey, este arrebatamento secreto da Igreja já passou do prazo.1 Em 1970 ele predisse que “em quarenta anos desde 1948 [ano da formação do Estado de Israel], ou por volta disso, tudo isso poderia ter lugar.2 Lindsey calcula os “quarenta anos” da duração bíblica de uma geração e alega, com base na parábola da Figueira (Mt 24:32-33), que a formação do Estado de Israel em 1948 assinala o início da última “geração” (Mt 24:34) que verá primeiramente o arrebatamento, daí os sete anos de tribulação, e finalmente o Retorno de Cristo em glória. Sendo que o arrebatamento, de acordo com Lindsey e a maioria dos dispensacionalistas, ocorre sete anos (Dn 9:27) antes do Retorno visível de Cristo em glória, já deveria ter ocorrido em 1981 ou 1982. O que isso significa é que o tempo já se esgotou para essas predições sensacionais, porém sem sentido.

A Ascensão, Expansão e Declínio do Pré-Tribulacionismo

Origem do Pré-Tribulacionismo

A crença de que a Igreja será arrebatada súbita e secretamente antes da grande e final tribulação é conhecida como pré-tribulacionismo. Sua origem é, em geral, identificada por volta dos anos da década iniciada em 1830. John N. Darby, pregador anglicano que se tornou fundador dos Irmãos de Plymouth, é considerado o expositor e promotor mais influente do arrebatamento pré-tribulacionista. Por suas seis visitas à América e extensa campanha de literatura do pré-tribulacionismo dos Irmãos de Plymouth, as ideias pré-tribulacionistas espalharam-se rapidamente.

O período de expansão máxima e predomínio do pré-tribulacionismo foi na primeira metade do século vinte. Homens como Arno C. Gaebelein, C. I. Scofield, James M. Gray do Instituto Bíblico Moody, Reuben A. Torrey, do Instituto Bíblico de Los Angeles, Harry A. Ironside, da Igreja Memorial Moody, e Lewis Sperry Chafer da Faculdade Teológica Evangélica (atual Seminário Teológico de Dallas) desempenharam um importante papel na popularização do arrebatamento pré-tribulacionista.3 O fator único mais importante foi a ampla circulação da Bíblia de Scofield, editada em 1909 e revisada em 1917, que inculcava tal ensino entre as massas como o único ponto de vista bíblico correto.

Ressurgimento do Pós-Tribulacionismo 

Desde 1950, mais e mais eruditos evangélicos vêm abandonando o pré-tribulacionismo e retornando ao pós-tribulacionismo histórico que sustenta que a Igreja passará pela grande tribulação, ao final da qual Cristo virá para ressuscitar os santos adormecidos e salvar os crentes vivos.

Crédito para o ressurgimento do pós-tribulacionismo deve ser dado primeiro de tudo à influência de George E. Ladd, Professor de Novo Testamento do Seminário Teológico Fuller. Alguns de seus importantes livros sobre este assunto são Crucial Questions About the Kingdom of God [Questões Cruciais Sobre o Reino de Deus] (1952), The Blessed Hope [A Bem-aventurada Esperança] (1956) e The Last Things [As Últimas Coisas] (1978). Sua respeitada erudição associada a sua dedicação aos princípios evangélicos têm levado muitos eruditos evangélicos a repensarem suas posições pré-tribulacionistas.

A influência de Ladd pode ser vista nos seguintes significativos estudos produzidos por eruditos que acataram o pós-tribulacionismo e têm escrito em sua defesa: The Greatness of the Kingdom [A Grandeza do Reino] (1959), de Alva J. McClain, presidente do Seminário Teológico da Graça, em Winona Lake, Indiana; The Imminent Appearing of Christ [O Iminente Aparecimento de Cristo] (1962), de J. Barton Payne, Professor de Velho Testamento na Faculdade Evangélica Trinity; e The Church and the Tribulation [A Igreja da Tribulação] (1973), de Robert H. Gundry, Professor de Estudos Religiosos na Faculdade Westmont, California.4

Tais estudos têm influenciado numerosos eruditos dentro de instituições tradicionalmente pré-tribulacionistas a retornarem ao pós-tribulacionismo histórico. A Igreja Evangélica Livre da América, por exemplo, que no passado era defensora do arrebatamento pré-tribulacionista, permitiu que professores da Escola Evangélica de Divindade Trinity desafiassem o pré-tribulacionismo em sua conferência ministerial anual em janeiro de 1981. Os desafios e respostas, publicadas em 1984 como um simpósio intitulado O Arrebatamento: Pré- Mid- ou Pós-Tribulacionistas, oferece um debate bastante erudito sobre as questões relativas ao Arrebatamento.

Um Pressuposto Equivocado. Mesmo uma leitura superficial da literatura pré-tribulacionista é suficiente para deixar uma pessoa ciente do fato de que a crença no arrebatamento secreto repousa muito mais sobre pressuposições subjetivas do que no ensinamento bíblico. O pressuposto principal é o de que Deus tem um plano diferente para a Igreja em relação a Israel. Consequentemente, presume-se que a Igreja deve ser removida da terra antes que Deus possa tratar com os judeus levando-os à conversão em larga escala, mediante a experiência da grande tribulação.

John F. Walvoord, destacado campeão do arrebatamento secreto, reconhece explicitamente a importância desse pressuposto ao escrever: “A questão do arrebatamento é determinado mais por eclesiologia do que por escatologia”. Em outras palavras, mais pelo entendimento que se tem sobre a relação entre a Igreja e Israel do que por ensinos bíblicos concernentes ao fim.5 C. C. Ryrie, outro pré-tribulacionista destacado, expressa a mesma convicção, declarando: “A distinção entre Israel e a Igreja leva à crença de que a Igreja será tomada da Terra antes do início da tribulação (o que, num sentido mais amplo, diz respeito a Israel)”.6

Hal Lindsey vai ao ponto de tornar a distinção entre Israel e a Igreja sua “principal razão” para crer que o Arrebatamento ocorre antes da Tribulação.7 Alega que “se o Arrebatamento tivesse lugar ao mesmo tempo da segunda vinda, não haveria mortais deixados que fossem crentes; portanto, não haveria ninguém para ir para o reino e repovoar a Terra”.8 Ou seja, uma vez que Lindsey presume que o Reino messiânico predito pelos profetas do Velho Testamento será estabelecido por Cristo por ocasião de Seu Segundo Advento como um reino terrestre que consiste predominantemente de judeus mortais e crentes, então a necessidade do arrebatamento da Igreja deve ocorrer antes. Como pode Cristo vir estabelecer um Reino milenial judaico sobre a Terra se todos os crentes estão arrebatados desta Terra por ocasião de Sua Vinda?

O Segundo Advento Dividido em Duas Fases 

Para solucionar este dilema, os dispensacionalistas dividem o Segundo Advento em duas fases: Primeiro, uma vinda invisível para arrebatar secretamente a Igreja, e, segundo, uma vinda visível sete anos mais tarde para destruir os ímpios e estabelecer o Reino Judaico milenial. O raciocínio por detrás desse arranjo pode parecer correto, mas está errado em vista de fundamentar-se sobre o incorreto pressuposto de que há uma distinção radical entre o plano de Deus para Israel e para a Igreja.

Não há base bíblica para uma distinção radical entre Israel e a Igreja. O Novo Testamento não retrata o futuro de Israel como um reino político milenial separado na Palestina, mas como um de bênçãos duradouras compartilhado com todos os remidos de todas as eras numa nova Terra restaurada.

Desafortunadamente, é esse pressuposto equivocado que determina a interpretação de textos bíblicos aduzidos em apoio ao arrebatamento. Argumenta-se, por exemplo, que um certo texto não pode referir-se à Igreja porque descreve a grande tribulação, que se supõe aplicar-se apenas a Israel. Esse tipo de raciocínio circular, com base num pressuposto gratuito, não é o método correto de interpretar textos bíblicos. As conclusões devem ser extraídas de exegese cuidadosa, não de pressupostos preconcebidos.

Quatro Razões Para Rejeitar o Arrebatamento Secreto

Um cuidadoso estudo de textos bíblicos relevantes quanto ao Retorno de Cristo sugere pelo menos quatro razões principais para rejeitar o ponto de vista de uma Segunda Vinda de Cristo em dois estágios.

O Vocabulário do Segundo Advento 

A primeira razão para rejeitar um arrebatamento secreto que antecede à tribulação é o fato de que o vocabulário do Segundo Advento não oferece respaldo para tal ponto de vista. Nenhuma das três palavras gregas usadas no Novo Testamento para descrever o Retorno de Cristo, ou seja, parousia, vinda, apokalypsis, revelação, e epiphaneia, aparecimento, sugere um arrebatamento secreto pré-tribulacional como objeto da esperança cristã no Advento.

Os pré-tribulacionistas alegam que a palavra parousia, vinda, é usada por Paulo em 1 Tessalonicenses 4:15 para descrever o arrebatamento secreto. Mas em 1 Tessalonicenses 3:13 Paulo emprega a mesma palavra para descrever a vinda de nosso Senhor Jesus Cristo com todos os Seus santos, uma descrição, segundo os pré-tribulacionistas, da segunda fase do Retorno de Cristo. Novamente, em 2 Tessalonicenses 2:8, Paulo emprega o termo parousia, vinda, em referência à vinda de Cristo que causará a destruição do anticristo, um evento que, de acordo com os pré-tribulacionistas, supostamente ocorrerá na segunda fase da Vinda de Cristo.

Semelhantemente, as palavras apokalypsis, revelação, e epiphaneia, aparecimento, são utilizadas para descrever tanto o que os pré-tribulacionistas chamam de arrebatamento (1 Co 1:7; 1 Tm 6:14) e o que chamam de Retorno ou segunda fase da Vinda de Cristo (2 Ts 1:7-8, 2:8). Destarte, o vocabulário da Bendita Esperança não propicia base alguma para uma distinção do Retorno de Cristo em duas fases, uma vez que seus termos originais são empregados intercambiavelmente para descrever o mesmo evento. Mais importante ainda é o fato de que cada um desses três termos é claramente empregado para descrever o Retorno de Cristo pós-tribulacional, o que é visto como objeto da esperança do crente.

A parousia, por exemplo, é indisputavelmente pós-tribulacional em Mateus 24:27, 38, 39 e em 2 Tessalonicenses 2:8. O mesmo é verdade de apokalypsis, revelação, em 2 Tessalonicenses 1:7 e de epiphaneia, aparecimento, em 2 Tessalonicenses 2:8. Portanto, o vocabulário da Bendita Esperança exclui a possibilidade de uma Vinda Secreta de Cristo para arrebatar a Igreja, seguida de uma tribulação de sete anos e da Vinda gloriosa, visível para estabelecer o Reino Judaico milenial. Os termos usados claramente apontam a um Advento de Cristo único, indivisível, pós-tribulacional para trazer salvação aos crentes e retribuição aos descrentes.

Nenhum Arrebatamento da Igreja 

Uma segunda razão para rejeitar um arrebatamento pré-tribulacional secreto da Igreja é o fato de que não há qualquer indício no Novo Testamento de um arrebatamento instantâneo da Igreja. A descrição mais notória do Segundo Advento encontrada em 1 Tessalonicenses 4:15-17 sugere exatamente o oposto quando fala que o Senhor desce do céu dada a Sua palavra de ordem, ouvida a voz do arcanjo, e ressoada a trombeta de Deus ... os mortos em Cristo ressuscitarão primeiro; depois nós, os vivos, os que ficarmos, seremos arrebatados juntamente com eles, entre nuvens, para o encontro do Senhor nos ares.

O clamor, a trombeta e o grande ajuntamento dos vivos e santos ressurretos dificilmente sugeriria um evento secreto, instantâneo e invisível. Pelo contrário, como frequentemente se tem assinalado, esta talvez seja a passagem mais barulhenta da Bíblia. A referência a um ressoar “da trombeta” e paralelamente ao texto de Mateus 24:31 e 1 Coríntios 15:52, que falam de fortes sons de trombeta, corroboram a visibilidade e natureza pública do Segundo Advento. Nenhum traço de um arrebatamento secreto pode ser encontrado em qualquer destas passagens.

Nenhuma Remoção da Igreja da Grande Tribulação

Uma terceira razão para rejeitar a noção de um arrebatamento secreto pré-tribulacional da Igreja é o fato de que tal noção não tem apoio das passagens que tratam da tribulação. Por exemplo, em seu discurso no Monte das Oliveiras, Jesus fala da grande tribulação que imediatamente precederá a Sua vinda e promete que por causa dos escolhidos tais dias serão abreviados (Mt 24:21-22, 29). Alegar que os eleitos são apenas os crentes judeus, e não membros da Igreja, representa ignorar que Cristo está se dirigindo a Seus apóstolos que representam não só o Israel nacional, mas a Igreja em escala ampla. Isto é confirmado pelo fato de que tanto Marcos quanto Lucas fazem referência ao mesmo discurso para a Igreja gentílica (Marcos 13; Lucas 21).

É também digno de nota a grande semelhança entre a descrição que Cristo faz do arrebatamento da Igreja em Mateus 24:30, 31 e a de Paulo em 1 Tessalonicenses 4:16, 17. Ambos os textos mencionam a descida do Senhor, a trombeta que soa, os anjos acompanhantes e a reunião do povo de Deus. Tais semelhanças sugerem que ambas as passagens descrevem o mesmo evento. Contudo, em Mateus o arrebatamento de Cristo é explicitamente situado após a tribulação (Mt 24:29), ao tempo da Vinda de Cristo com poder e grande glória (vs. 29-30). O paralelismo entre as duas passagens indica claramente que o arrebatamento da Igreja não precede, pelo contrário, segue à grande tribulação.

Cristo nunca prometeu a Sua Igreja um arrebatamento pré-tribulação deste mundo. Antes, prometeu proteção em meio à tribulação. Em Sua petição ao Pai, Ele disse: Não peço que os tires do mundo, mas que os livres do mal (Jo 17:15). Semelhantemente, à Igreja de Filadélfia Cristo promete: Eu te guardarei da hora da provação que há de vir sobre o mundo inteiro, para experimentar os que habitam sobre a Terra (Ap 3:10). Se a Igreja estivesse ausente desta Terra durante a hora de prova, não haveria necessidade de proteção divina.

Nenhum Arrebatamento Pré-Tribulação nas Escrituras  

Por último, a noção de um arrebatamento secreto pré-tribulacional é negada por Paulo e pelo livro de Apocalipse. Em suas admoestações aos tessalonicenses, Paulo explica que os crentes terão alívio da tribulação desta era presente “quando do céu se manifestar o Senhor Jesus Cristo com os anjos do Seu poder, em chama de fogo, tomando vingança contra os que não conhecem a Deus... (2 Ts 1:7-8). Em outras palavras, os crentes experimentarão libertação dos sofrimentos desta era não mediante um arrebatamento secreto, mas por ocasião da revelação pós-tribulacional de Cristo.

No segundo capítulo Paulo refuta as concepções errôneas que prevaleciam entre os tessalonicenses de que o dia do Senhor havia vindo. Para refutar esse equívoco, ele cita dois eventos principais que deveriam dar-se antes da Vinda do Senhor, ou seja, a rebelião e o aparecimento do homem da iniquidade (2 Ts 2:3) que perseguiria o povo de Deus.

O que é crucial nesta passagem é que Paulo não faz menção de um arrebatamento pré-tribulacional como um precedente necessário para a Vinda do Senhor. Contudo, este seria o argumento mais forte que Paulo poderia apresentar para provar aos tessalonicenses que o dia do Senhor não poderia possivelmente ter vindo, uma vez que o seu arrebatamento para fora deste mundo ainda não tivera lugar. A omissão de Paulo desse argumento vital sugere fortemente que Paulo não cria num arrebatamento pré-tribulacional da Igreja.

Esta conclusão também é apoiada pela menção por Paulo do aparecimento do anticristo um evento indiscutivelmente tribulacional que os crentes verão antes da vinda do Senhor. Se Paulo esperasse que a Igreja fosse arrebatada deste mundo antes da tribulação causada pelo aparecimento do anticristo, ele dificilmente teria ensinado que os crentes veriam tal evento antes da vinda do Senhor. Que interesse os tessalonicenses teriam no aparecimento do anticristo, juntamente com a tribulação que o acompanharia, se devessem ser arrebatados para longe desta Terra antes de esses eventos terem lugar? Assim, tanto por sua omissão quanto por sua afirmação, Paulo nega o ponto de vista de um arrebatamento pré-tribulacional da Igreja.

Nenhum Arrebatamento Pré-Tribulacional no Apocalipse 

O livro de Apocalipse trata em maiores detalhes do que qualquer outro livro do Novo Testamento dos eventos associados com a grande tribulação, tais como o soar das sete trombetas, o aparecimento da besta que inflige uma terrível perseguição sobre os santos de Deus e o derramamento das sete últimas pragas (Ap 8, 16). Conquanto João descreva em grande detalhe os eventos tribulacionais, ele nunca menciona ou sugere um Advento de Cristo secreto e pré-tribulacional para levar a Igreja embora. Isso surpreende muito, em vista de que o expresso propósito de João é instruir as Igrejas com respeito aos eventos finais.

João explicitamente menciona uma incontável multidão de crentes que passarão pela grande tribulação. São estes os que vêm da grande tribulação, lavaram suas vestiduras, e as alvejaram no sangue do Cordeiro (Ap 7:14). Os pré-tribulacionistas argumentam que esses crentes são somente da raça judaica, supostamente em vista de que a Igreja em Apocalipse 4 a 19 não mais está sobre a Terra, mas no céu. Tal raciocínio perde o seu crédito, primeiramente pelo fato de que em parte alguma João diferencia entre os santos na tribulação que sejam judeus ou gentios.

João explicitamente declara que os crentes vitoriosos da tribulação vêm de toda nação, tribo, língua e povo (Ap 7:9). Esta frase ocorre repetidamente no Apocalipse para designar não exclusivamente os judeus, mas inclusivamente todo membro da família humana (Ap 5:9; 10:11; 13:7; 14:6). O Cordeiro, por exemplo, é louvado pelos 24 anciãos por ter resgatado homens de toda tribo e língua e povo e nação (Ap 5:9). Obviamente, Cristo não resgatou somente judeus, mas pessoas de todas as raças.

Êxtase de João, não Arrebatamento da Igreja 

O argumento de que a Igreja em Apocalipse 4 a 19 está no céu baseia-se num falso pressuposto de que a ordem a João Sobe para aqui, e te mostrarei o que deve acontecer depois destas cousas (Ap 4:1), refere-se supostamente ao arrebatamento da Igreja no céu. Esta é uma interpretação sem fundamento, porque o texto não fala do arrebatamento da Igreja, mas da experiência visionária extática de João. Até mesmo John F. Walvoord, destacado pré-tribulacionista, reconhece abertamente que “não há autoridade para ligar o arrebatamento com esta expressão”.9

As semelhanças entre as admoestações dadas nas cartas às sete Igrejas e as que são dadas aos santos que enfrentam a tribulação sugerem que os dois são essencialmente o mesmo povo. Por exemplo, quatro vezes nas sete cartas a necessidade para “suportar” é realçada (Ap 2:2, 3, 19; 3:10), e se espera a mesma qualidade dos santos que passam pela tribulação (Ap 13:10; 14:12). Semelhantemente, a necessidade de vencer, expressa sete vezes nas cartas às Igrejas (Ap 2:7, 11, 17, 26; 3:5, 12, 21), é o próprio atributo dos santos na tribulação que venceram a besta e sua imagem (Ap 15:2). Dificilmente se conceberia que João tencionava atribuir as mesmas características a dois grupos diferentes de pessoas. 

A Igreja Sofre a Tribulação, mas não a Ira Divina 

Em Apocalipse 22:16, Jesus reivindica ter enviado o Seu anjo a João para testificar estas coisas à Igreja. É difícil ver como as mensagens dadas pelo anjo a João poderiam ser um testemunho para as Igrejas, se a Igreja não está diretamente envolvida na maior parte dos eventos descritos no livro (Ap 4, 19).

O ponto básico da questão é que a Igreja em Apocalipse sofrerá perseguição por poderes satânicos durante a tribulação final, mas não sofrerá a ira divina. A ira divina, que é retratada pelas sete pragas apocalípticas, não é derramada indiscriminadamente sobre todos, mas seletivamente sobre aqueles que são portadores da marca da besta e adoradores da sua imagem (Ap 16:2; cf. 14:9-10).

Tal como os antigos israelitas desfrutaram da proteção de Deus durante as dez pragas (Êx 11:7), assim o povo de Deus será protegido quando Sua ira divina cair sobre os ímpios. Essa divina proteção é representada em Apocalipse por um anjo que sela os servos de Deus em suas testas (Ap 7:3), de modo a que sejam poupados quando a ira de Deus vier sobre os impenitentes (Ap 9:4). Por fim, o povo de Deus será resgatado pelo glorioso Retorno de Cristo (Ap 16:15; 19:11-21). Destarte, a Revelação não retrata um arrebatamento pré-tribulacional da Igreja, mas um Retorno pós-tribulacional de Cristo. 

Conclusão

À luz das razões discutidas acima, concluímos que o ensino popular de uma Vinda Secreta de Cristo para arrebatar a Igreja antes da tribulação final é um sinal errado do Tempo do fim destituído de qualquer respaldo bíblico. Tal crença torna Deus culpado de chocante discriminação, por dar tratamento preferencial à Igreja, que é removida da Terra antes da tribulação final reservada aos judeus. As Escrituras ensinam que a Segunda Vinda de Cristo é um evento único que ocorre após a grande tribulação, e será experimentada pelos crentes de todas as eras e de todas as raças. Esta é a Bendita Esperança que une toda nação, e tribo, e língua e povo (Ap 14:6).



NOTAS:

1. Hal Lindsey, The Rapture: Truth or Consequences (New York, 1983), p. 24.
2. Hal Lindsey, The Late Great Planet Earth (Grand Rapids, 1970), p. 54.
3. Para uma pesquisa breve, mas informativa, do desenvolvimento do pré-tribulacionismo, ver Richard R. Reiter, "A History of the Development of the Rapture Position," The Rapture. Pre-, Mid-, or Post-Tribulational Symposium (Grand Rapids, 1984), pp. 24-34.
4. Ver também Norman F. Douty, Has Christ's Return Two Stages? (New York, 1956); Alexander Reese, The Approaching Advent of Christ (Grand Rapids, 1975).
5. John F. Walvoord, The Rapture Question (Grand Rapids, 1957), p. 50.
6. C. C. Ryrie, Dispensationalism Today ( Chicago, Moody Press, 1965), p. 159.
7. Hal Lindsey, The Late Great Planet Earth (Grand Rapids, 1970), p. 143.
8. Ibid.
9. John F. Walvoord, The Revelation of Jesus Christ (Chicago, 1966), p. 103.




Autor: Samuele Bacchiocchi
Fonte: Monergismo